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"MAS, TENDO SIDO SEMEADO, CRESCE." Jesus. (Marcos, 4:32.)


DOS EFEITOS DA PRECE SOBRE OS ESPÍRITOS SOFREDORES

DOS EFEITOS DA PRECE SOBRE OS ESPÍRITOS SOFREDORES
Revista Espírita, dezembro de 1859

Um dos nossos assinantes nos escreveu de Lausanne:

"Há mais de quinze anos professo uma grande parte daquilo que a vossa ciência Espírita ensina hoje.
A leitura de vossas obras não fez senão me afirmar nesta crença; trouxe-me, por outro lado, uma grande consolação, e lança uma viva claridade sobre uma parte que não era senão trevas para mim.
Embora bem convencido que minha existência deveria ser múltipla, não podia me explicar em que se tornava o meu Espírito durante o intervalo.
Mil vezes obrigado, senhor, de haver-me iniciado nesses grandes mistérios, indicando-me um único caminho a seguir para ganhar um lugar melhor no outro mundo.
Abristes meu coração à esperança e duplicastes minha coragem para suportar as provas deste mundo.
Consenti, pois, senhor, vir em minha ajuda para reconhecer uma verdade que me interessa no mais alto grau.
Eu sou protestante, e na nossa Igreja não se ora jamais pelos mortos, o evangelho não no-lo ensina.
Os Espíritos que evocais, freqüentemente, dissestes, pedem os socorros de vossas preces. É, pois, porque estão ainda sob a influência das idéias adquiridas na Terra, ou é verdade que Deus leva em conta as preces dos vivos para abreviar o sofrimento dos mortos?
Esta questão, senhor, é muito importante para mim e para outros de meus correligionários, que contrataram alianças católicas.
Para terem respostas satisfatórias, seria necessário, eu o creio, que o Espírito de um protestante esclarecido, tal qual um dos nossos ministros, quisesse se manifestar a vós em companhia de um de vossos eclesiáticos."

A questão é dupla: 1º A prece é agradável àqueles por quem se ora? 2°- É-lhes útil?

Escutemos, de início, sobre a primeira questão o Reverendo Pai Félix em uma introdução notável de um pequeno livro intitulado: os Mortos sofredores e abandonados.

"A devoção aos mortos não é somente a expressão de um dogma e a manifestação de uma crença, é um encanto da vida, uma consolo do coração.
Que há, com efeito de mais suave ao coração que esse culto piedoso que nos prende à memória e aos sofrimentos dos mortos?
Crer na eficácia da prece e nas boas obras para o alívio daqueles que perdemos, quando os choramos, que essas lágrimas derramadas sobre eles podem ainda ser-lhes de socorro; crer, enfim, que mesmo nesse mundo invisível que habitam nosso amor pode ainda visitá-los por seus benefícios: que doce, que amável crença!
E, nessa crença, que consolação para aqueles que viram a morte entrar sob seu teto, e ferir junto de seu coração!
Se essa crença e esse culto não existissem, o coração humano, pela voz dos seus mais nobres instintos, diz a todos aqueles que o compreendem que seria necessário inventá-los, não fora senão para colocar a doçura na morte e o encanto até nos seus funerais.
Nada, com efeito, não transforma e não transfigura o amor que roga sobre uma tumba ou chora nos funerais, como essa devoção, à lembrança e aos sofrimentos dos mortos.
Essa mistura da religião e da dor, da prece e do amor, tem não sei o que de delicado e de enternecedor tudo junto.
A tristeza que chora aí se torna um auxiliar da piedade que roga; a piedade, por sua vez, aí se torna para a tristeza o mais delicioso aroma; e a fé, a esperança e a caridade não se encontram nunca melhor para honrar a Deus consolando os homens, e colocar no alívio dos mortos a consolação dos vivos!
"Esse encanto tão doce que encontramos no nosso comércio fraternal com os mortos, quanto se torna mais doce ainda quando chegamos a nos persuadir de que Deus, sem dúvida, não deixa esses defuntos queridos ignorantes completamente do bem que lhes fazemos.
Quem não desejou, quando ora por um pai ou um irmão trespassado, que ele estivesse ali para escutar, e quando se consagra por ele, que estivesse ali para ver?
Quem não se disse, enxugando suas lágrimas junto ao caixão de um parente ou de um amigo perdido: "Se, pelo menos, ele pudesse me ouvir!
Quando meu amor lhe oferece, com lágrimas, a prece e a consagração, se eu estivesse seguro que ele o sabe e que seu amor compreende sempre o meu!
Sim, se eu pudesse crer, não somente que o alívio que lhe envio chegue a ele, mas se eu pudesse me persuadir também que Deus se digna delegar um de seus anjos para lhe ensinar, levando-lhe meu benefício, que esse alívio vem de mim: oh! Deus bom para aqueles que choram, que bálsamo em minha ferida! Que consolação na minha dor!"
"A Igreja, é verdade, não nos obriga a crer que os nossos irmãos mortos sabem, com efeito, no Purgatório, o que fazemos por eles na Terra, mas também não o proíbe; ela o insinua, e parece persuadir-nos pelo conjunto de seu culto e de suas cerimônias', e homens sérios e honrados na Igreja, não temem afirmá-lo.
Qualquer que seja, de resto, se os mortos não têm o conhecimento presente e distinto das preces e das boas obras que fazemos por eles, é certo que lhes sentem os efeitos salutares; e essa firme crença não basta a um amor que quer se consolar da dor pelo benefício, e fecundar suas lágrimas pelos sacrifícios?"

O que o P. Félix admite como uma hipótese, a ciência Espírita admite como uma verdade incontestável, porque disso lhe dá a prova patente.
Sabemos, com efeito, que o mundo invisível está composto daqueles que deixaram seu envoltório corporal, dito de outro modo, das almas daqueles que viveram na Terra; essas almas, ou esses Espíritos, o que é a mesma coisa, povoam o espaço; e estão por toda parte, aos nossos lados tão bem como nas regiões mais distantes; desembaraçados do pesado e incômodo fardo que os retinha na superfície do solo, não tendo mais que um envoltório etéreo, semi-material, eles se transportam com a rapidez do pensamento.
A experiência prova que podem vir ao nosso chamado; mas vêm mais ou menos de bom grado, com mais ou menos prazer; segundo a intenção, isso se concebe; a prece é um pensamento, um laço que nos liga a eles: é um apelo, uma verdadeira evocação; ora, como a prece, que ela seja eficaz ou não, é sempre um pensamento benevolente, não pode, pois, ser senão agradável àqueles que lhes são o objeto.
É-lhes útil ?  
É uma outra questão.
Aqueles que contestam a eficácia da prece dizem: Os decretos de Deus são imutáveis, e não pode derrogá-los a pedido do homem. - Isso depende do objeto da prece, porque é bem certo que Deus não pode infringir suas leis para satisfazer a todos os pedidos inconsiderados que lhes são endereçados; consideremo-la somente do ponto de vista do alívio das almas sofredoras.
Diremos primeiro que, admitindo que a duração efetiva dos sofrimentos não pode ser abreviada, a comiseração, a simpatia, são um adoçamento para aquele que sofre.
Que um prisioneiro seja condenado a vinte anos de prisão, não sofrerá mil vezes mais se estiver só, isolado, abandonado?
Mas que uma alma caridosa e compassiva venha visitá-lo, consolá-lo, encorajá-lo, não tivesse o poder de quebrar suas cadeias antes do tempo certo, ela lhe faria parecer menos pesadas, e os anos lhe pareceriam mais curtos.
Qual é aquele que, na Terra, não encontrou na compaixão um alívio às suas misérias, uma consolação na expansão da amizade?
Podem as preces abreviarem os sofrimentos?
O Espiritismo diz: Sim; e o prova pelo raciocínio e pela experiência: pela experiência, naquilo que são as próprias almas sofredoras que vêm confirmá-lo, e nos pintam a mudança de sua situação; pelo raciocínio, considerando-se seu modo de ação.
As comunicações incessantes que temos com os seres de além-túmulo fazem passar sob os nossos olhos todos os graus do sofrimento e da felicidade.
Vemos, pois, seres infelizes, horrivelmente infelizes, e se o Espiritismo, de acordo nisso com um grande número de teólogos, não admite o fogo senão como uma figura, um emblema das maiores dores, em uma palavra, como um fogo moral, é preciso convir que a situação de alguns não vale muito mais que se estivessem no fogo material.
O estado feliz, ou infeliz, depois da morte não é, pois, uma quimera, um verdadeiro fantasma.
Mas o Espiritismo nos ensina ainda, que a duração do sofrimento depende, até um certo ponto, da vontade do Espírito, e que ele pode abreviá-lo pelos esforços que faça para melhorar-se.
A prece, eu entendo a prece real, a do coração, a que é ditada por uma verdadeira caridade, leva o Espírito ao arrependimento, desenvolve nele bons sentimentos; ela o esclarece, fá-lo compreender a felicidade daqueles que estão acima dele; leva-o a fazer o bem, a se tomar útil, porque os Espíritos podem fazer o bem e o mal; ela tira-o, de alguma forma, do desencorajamento no qual se entorpece; fá-lo entrever a luz.
Pelos seus esforços, portanto, pode sair do lamaçal onde está mergulhado; assim é que a mão de socorro que se lhe estende pode abreviar-lhe os sofrimentos.
Nosso assinante nos pergunta se os Espíritos que solicitam prece não estariam ainda sob a influência das idéias terrestres:
A isso respondemos que, entre os Espíritos que se comunicam conosco, há os que, quando vivos, professaram todos os cultos, e que todos, católicos, protestantes, judeus, muçulmanos, budistas, a esta pergunta;
Que podemos fazer para que vos seja útil? Respondem: Orai por mim. –
Uma prece, segundo o rito que professastes, vos seria mais útil ou mais agradável? –
O rito é a forma; a prece do coração não tem rito.
- Nossos leitores se lembram, sem dúvida, da evocação de uma viúva de Malabar, inserta no número da Revista de dezembro de 1858.
Quando se lhe disse: Vós nos pedis para orar por vós, mas somos cristãos; nossas preces poderiam vos ser agradáveis? Ela respondeu: Não há senão um Deus para todos os homens.
Os Espíritos sofredores se prendem àqueles que oram por eles, como o ser reconhecido àquele que lhe faz o bem.
Essa mesma viúva de Malabar veio várias vezes às nossas reuniões sem ser chamada; aí vinha, dizia, para se instruir; seguia-nos mesmo na rua, como constatamos com a ajuda de um médium vidente.
O assassino Lemaire, cuja evocação narramos no número de março de 1858, evocação que, entre parêntese, havia excitado a verve zombeteira de alguns céticos, esse mesmo assassino, infeliz, abandonado, encontrou, num dos nossos leitores, um coração compassivo que dele teve piedade; vem, freqüentemente, visitá-lo, e tratou de se manifestar por todas as espécies de meios, até que essa mesma pessoa, tendo a ocasião de se esclarecer sobre essas manifestações, soube que era Lemaire que queria testemunhar-lhe seu reconhecimento.
Quando teve a oportunidade de exprimir seu pensamento, disse-lhe:
Agradeço-vos, alma caridosa! Eu estava só com o remorso da minha vida passada, e tivestes piedade de mim; eu estava abandonado, e pensastes em mim; eu estava no abismo, e me estendestes a mão! Vossas preces foram para mim como um bálsamo consolador; compreendi a enormidade dos meus crimes, e pedi a Deus conceder-me a graça de repará-los por uma nova existência, quando poderia fazer tanto bem quanto mal eu fiz. Obrigado ainda, ó obrigado!

Eis, de resto, sobre os efeitos da prece, a opinião atual de um ilustre ministro protestante, o senhor Adolphe Monod, falecido no mês de abri l de 1856.
"O Cristo disse aos homens: Amai-vos uns aos outros. Esta recomendação encerra a de empregar todos os meios possíveis para testemunher a afeição aos seus semelhantes, sem entrar, para isso, em nenhum detalhe sobre a maneira de atingir esse objetivo.
Se é verdade que nada pode desviar o Criador de aplicar a justiça da qual ele é o tipo, a todas as ações do Espírito, não é menos verdadeiro que a prece que lhe endereçais por aquele por quem vos interessais, é para este último um testemunho de lembrança que não pode senão contribuir para lhe aliviar os sofrimentos e consolá-lo; desde que testemunhe o menor arrependimento, e então somente, ele é socorrido, mas não ignora jamais que uma alma simpática se ocupou dele; esse pensamento leva-o ao arrependimento, e deixa-o na doce persuasão de que sua intercessão lhe foi útil.
Disso resulta, necessariamente, de sua parte, um sentimento de reconhecimento e de afeição por aquele que lhe deu essa prova de amizade ou de piedade; conseqüentemente, o amor que o Cristo recomenda aos homens não faz senão aumentar entre eles; eles têm, pois, ambos que obedecer à lei de amor e união de todos os seres, lei de Deus, que deve levar à unidade, que é o fim do Espírito."
- Não tendes nada a acrescentar a essas explicações? - R. Não, elas encerram tudo.
- Eu vos agradeço por consentir em no-las dar. - R. É uma felicidade, para mim, contribuir para a união das almas, união que os bons Espíritos procuram fazer prevalecer sobre todas as questões de dogma que os dividem.

SENSAÇÕES DOS ESPÍRITOS

SENSAÇÕES DOS ESPÍRITOS
Revista Espírita, dezembro de 1858

Os Espíritos sofrem? Que sensações experimentam? Tais são as perguntas que se dirigem naturalmente e que tentaremos resolver. Devemos dizer, primeiramente, que para isso não nos contentamos com as respostas dos Espíritos; devemos, por numerosas observações, de alguma sorte, tomar a sensação sobre o fato.

Em uma de nossas reuniões, e pouco antes que São Luís nos desse a bela dissertação sobre a avareza, que inserimos em nosso número do mês de fevereiro, um de nossos sócios contou o fato seguinte, a propósito dessa mesma dissertação.

"Estávamos, disse ele, ocupados com evocações em uma pequena reunião de amigos, quando se apresentou, inopinadamente e sem que o tivéssemos chamado, o Espírito de um homem que havíamos conhecido muito, e que, quando vivo servira de modelo ao retrato do avaro traçado por São Luís; um desses homens que vive miseravelmente no meio da fortuna, que se privam, não pelos outros, mas para amontoar sem proveito para ninguém.
Era inverno, estávamos perto do fogo; de repente, esse Espírito nos lembrou seu nome, com o qual não sonhávamos de modo algum, e nos pediu a permissão de vir, durante três dias, aquecer-se na nossa lareira, dizendo que sofre horrivelmente do frio que ele, voluntariamente suportou durante sua vida, e que fez os outros suportarem por sua avareza. Será, acrescentou ele, um abrandamento que obtive, se consentis em mo concedê-lo."

Esse Espírito sentia uma sensação penosa de frio; mas como o sentia? Aí estava a dificuldade. Dirigimos a São Luís as perguntas seguintes a esse respeito:

Consentiríeis em nos dizer como esse Espírito de avaro, que não tem mais corpo material, podia sentir o frio e pedir para se aquecer?

- R. Podes imaginar os sofrimentos do Espírito pelos sofrimentos morais.

- Concebemos os sofrimentos morais, como os desgostos, os remorsos, a vergonha; mas o calor e o frio, a dor física, não são efeitos morais; os Espíritos sentem essas espécies de sensações?

- R. Tua alma sente o frio? Não; mas tem a consciência da sensação que atua sobre o corpo.

- Disso pareceria resultar que esse Espírito de avaro não sente um frio efetivo; mas que ele teria a lembrança da sensação do frio que suportou, e que essa lembrança, sendo para ele como uma realidade, tornava-se um suplício.

- R. E quase isso. Está bem entendido que há uma distinção, que compreendeis perfeitamente, entre a dor física e a dor moral; não se deve confundir o efeito com a causa.

- Se compreendemos bem, poder-se-ia, isso nos parece, explicar a coisa assim como segue:

O corpo é o instrumento da dor; senão a causa primeira, ao menos a causa imediata.
A alma tem percepção dessa dor: essa percepção é o efeito.
A lembrança que dela conserva pode ser tão penosa quanto a realidade, mas não pode ter ação física.
Com efeito, um frio nem um calor intensos, podem desorganizar os tecidos: a alma não pode nem gelar nem queimar.
Não vemos, todos os dias, a lembrança ou apreensão de um mal físico produzir o efeito da realidade? Ocasionar mesmo a morte? Todo o mundo sabe que as pessoas amputadas sentem dor no membro que não existe mais. Seguramente, não é nesse membro que está a sede, nem mesmo o ponto de partida da dor. O cérebro dela conservou a impressão, eis tudo.

Pode-se, pois, acreditar que há alguma coisa análoga no sofrimento do Espírito depois da morte. Essas reflexões são justas?

R. Sim; mais tarde compreendereis melhor ainda Esperai que fatos novos venham vos fornecer novos motivos de observação, e então deles podereis tirar conseqüências mais completas.

Isso se passou no começo do ano 1858; desde então, com efeito, um estudo mais aprofundado do perispírito, que desempenha um papel tão importante em todos os fenômenos espíritas, e do qual não se havia percebido, as aparições vaporosas ou tangíveis, o estado do Espírito no momento da morte, a idéia tão freqüente no Espírito que ainda está vivo, o quadro tão impressionante dos suicidas, dos supliciados, das pessoas absorvidas nos gozos materiais, e tantos outros fatos, vieram lançar luz sobre essa questão, e deram lugar às explicações das quais damos aqui o resumo.

O perispírito é o laço que une o Espírito à matéria do corpo: ele é haurido no meio ambiente, no fluido universal; tem, ao mesmo tempo, algo da eletricidade, do fluido magnético e, até a um certo ponto, da matéria inerte.
Poder-se-ia dizer que é a quintessência da matéria: é o princípio da vida orgânica, mas não o é da vida intelectual: a vida intelectual está no Espírito.
É, além disso, o agente das sensações exteriores.
No corpo, essas sensações estão localizadas pelos órgãos que lhes servem de canal. Destruído o corpo, as sensações são gerais. Eis porque o Espírito não diz que sofre antes da cabeça que dos pés. De resto, é preciso guardar-se de confundir as sensações do perispírito, tornado independente, com as do corpo: não podemos tomar essas últimas senão como termo de comparação, e não como analogia.
Um excesso de calor ou de frio pode desorganizar os tecidos do corpo e não pode resultar nenhum prejuízo ao perispírito.
Desligado do corpo, o Espírito pode sofrer, mas esse sofrimento não é o do corpo: entretanto, esse sofrimento não é um sofrimento exclusivamente moral, como o remorso, uma vez que se queixa do frio e do calor; não sofre mais no inverno que no verão: vimo-los passar através de chamas sem nada sentirem de penoso; a temperatura, portanto, não causa sobre eles nenhuma impressão.
A dor que sentem, portanto, não é uma dor física propriamente dita: é um vago sentimento íntimo, do qual o próprio Espírito não se apercebe perfeitamente, precisamente porque a dor não é localizada e porque não é produzida por agentes exteriores: é antes uma lembrança que uma realidade, mas uma lembrança também muito penosa.
Há, entretanto, algumas vezes, mais que uma lembrança, como vamos ver.

A experiência nos ensina que no momento da morte o perispírito se desliga mais ou menos lentamente do corpo; durante os primeiros instantes, o Espírito não se dá conta da sua situação; não crê estar morto; sente-se viver; vê seu corpo de um lado, sabe que é o seu, e não compreende que esteja dele separado: esse estado dura tão longo tempo quanto exista um laço entre o corpo e o perispírito.
Que se reporte à evocação do suicida dos banhos da Samaritana, que narramos no nosso número de junho. Como todos os outros, ele dizia: Não, não estou morto, e acrescentava: E, entretanto, sinto os vermes que me roem.
Ora, seguramente os vermes não roíam o perispírito, e ainda menos o Espírito, não roíam senão o corpo.
Mas como a separação do corpo e do perispírito não estava completa, disso resultava uma espécie de repercussão moral que lhe transmitia a sensação do que se passava no corpo. Repercussão talvez não seja a palavra, poderia fazer crer em um efeito muito material; era antes a visão do que se passava em seu corpo, ao qual se ligava seu perispírito, que produzia nele uma ilusão, que tomava por uma realidade.
Assim, não era uma lembrança, uma vez que, durante a vida, não havia sido roído pelos vermes: era o sentimento da atualidade.
Vê-se por aí as deduções que se podem tirar dos fatos, quando são observados atentamente.
Durante a vida, o corpo recebe as impressões exteriores e as transmite ao Espírito, por intermédio do perispírito que constitui, provavelmente, o que se chama fluido nervoso. Estando o corpo morto não sente mais nada, porque não há mais nele nem Espírito nem perispírito.
O perispírito, desligado do corpo, sente a sensação; mas como esta não lhe chega mais por um canal limitado, ela é geral. Ora, como, em realidade, não é senão um agente de transmissão, uma vez que é o Espírito quem tem a consciência, disso resulta que se pudesse existir um perispírito sem Espírito, não sentiria mais do que o corpo quando está morto; do mesmo modo que se o Espírito não tivesse perispírito, seria inacessível a toda sensação penosa; é o que ocorre para os Espíritos completamente depurados. Sabemos que quanto mais se depuram, mais a essência do perispírito se torna etérea; de onde se segue que a influência material diminui à medida que o Espírito progride, quer dizer, à medida que o próprio perispírito se torna menos grosseiro.
Mas, dir-se-á, as sensações agradáveis são transmitidas ao Espírito pelo perispírito, como as sensações desagradáveis; ora, se o Espírito puro é inacessível a umas, deve sê-lo igualmente às outras.
Sim, sem dúvida, para aquelas que provêm- unicamente da influência da matéria que conhecemos; o som de nossos instrumentos, o perfume de nossas flores não lhe causam nenhuma impressão, e, todavia, há neles sensações íntimas de um encanto indefinível, das quais não podemos fazer nenhuma idéia, porque somos, a esse respeito, como cegos de nascença a respeito da luz; sabemos que isso existe; mas por qual meio? Aí se detém para nós a ciência. Sabemos que há percepção, sensação, audição, visão, que essas faculdades são atributos de todo o ser, e não, como no homem, de uma parte do ser; mas, ainda uma vez, por qual intermediário? É o que não sabemos. Os próprios Espíritos não podem disso nos darem conta, porque nossa língua não foi feita para exprimir idéias que não temos, não mais que numa população de cegos não existiriam termos para exprimirem os efeitos da luz; não mais que na língua dos selvagens, não há termos para exprimir nossas artes, nossas ciências e nossas doutrinas filosóficas.
Dizendo que os Espíritos são inacessíveis às impressões da nossa matéria, queremos falar de Espíritos muito elevados, cujo envoltório etéreo não tem analogia neste mundo.
Não ocorre o mesmo com aqueles cujo perispírito é mais denso: e estes percebem nossos sons e nossos odores, mas não por uma parte limitada de seu ser, como quando vivo. Poder-se-ia dizer que as vibrações moleculares se fazem sentir em todo o seu ser e chegam assim ao seu sensorium commune, que é o próprio Espírito, embora de modo diferente, e talvez também com uma impressão diferente, o que produz uma modificação na percepção. Eles ouvem o som de nossa voz, e todavia nos compreendem sem o socorro da palavra, unicamente pela transmissão do pensamento, e o que vem em apoio ao que dizemos, é que essa penetração é tanto mais fácil quanto o Espírito esteja mais desmaterializado. Quanto à visão, ela é independente de nossa luz. A faculdade de ver é um atributo essencial da alma: para ela não há obscuridade; entretanto, ela é mais extensa, mais penetrante, naqueles que estão mais depurados.
A alma, ou o Espírito, portanto, tem em si mesma a faculdade de todas as percepções; na vida corpórea, elas estão obliteradas pela grosseria de nossos órgãos; na vida extracorpórea, elas o são menos e menos à medida que se torna menos compacto o envoltório semi-material.

Esse envoltório, haurido do meio ambiente, varia segundo a natureza dos mundos. Passando de um mundo a outro, os Espíritos mudam de envoltório, como nós mudamos de vestuário, passando do inverno ao verão, ou do pólo ao equador. Os Espíritos mais elevados, quando vêm nos visitar, revestem, pois, o perispírito terrestre, e desde então suas percepções se operam como nos Espíritos vulgares; mas tanto inferiores, como superiores, não ouvem e não sentem senão o que querem ouvir ou sentir. Sem terem órgãos sensitivos podem tomar-se, à vontade, suas percepções ativas ou nulas; não há senão uma coisa que são obrigados a ouvir, são os conselhos dos bons Espíritos. A visão é sempre ativa, mas podem, reciprocamente, se tornarem invisíveis uns aos outros. Segundo a classe que ocupem, eles podem se ocultar daqueles que lhes são inferiores, mas não daqueles que lhes são superiores. Nos primeiros momentos que seguem à morte, a visão do Espírito é sempre perturbada e confusa; clareia à medida que ele se desliga, e pode adquirir a mesma claridade que durante a vida, independentemente de sua penetração através dos corpos que nos são opacos. Quanto à sua extensão através do espaço indefinido, no passado e no futuro, depende do grau de pureza e de elevação do Espírito.

Toda essa teoria, dir-se-á, não é muito tranqüilizadora. Pensávamos que uma vez desembaraçado de nosso grosseiro envoltório, instrumento das nossas dores, não sofreríamos mais, e eis que nos ensinais que sofreremos ainda; que, seja de uma maneira ou de outra, isso não é menos sofrer. Ah! sim, podemos ainda sofrer, e muito, e por muito tempo, mas podemos também não mais sofrer, mesmo desde o instante em que deixamos esta vida corpórea.

Os sofrimentos deste mundo são, algumas vezes, independentes de nós, mas muitos são as conseqüências de nossa vontade. Que se remonte à fonte e ver-se-á que o maior número é a conseqüência de causas que poderíamos evitar. Quantos males, quantas enfermidades, o homem deve aos excessos, à sua ambição, às suas paixões, em uma palavra! O homem que houvesse sempre vivido sobriamente, que não houvesse abusado de nada, que houvesse sempre sido simples em seus gostos, modesto em seus desejos, se pouparia de muitas tributações. Ocorre o mesmo com o Espírito: os sofrimentos que suporta são sempre a conseqüência da maneira com a qual viveu na Terra; não terá mais, sem dúvida, a gota e os reumatismos, mas terá outros sofrimentos que não valem mais. Vimos que esses sofrimentos são o resultado de laços que ainda existem entre ele e a matéria; que quanto mais desligado da matéria, dito de outro modo, quanto mais desmaterializado, menos tem sensações penosas; ora, dele depende se livrar dessa influência, desde esta vida; tem o seu livre arbítrio e, por conseqüência, a escolha entre fazer ou não fazer: que dome suas paixões animais, que não tenha ódio, nem inveja, nem ciúme, nem orgulho; que não seja dominado pelo egoísmo, que purifique sua alma pelos bons sentimentos, que faça o bem, que dê às coisas deste mundo a importância que elas merecem, então, mesmo sob seu envoltório corporal, está já depurado, e já desligado da matéria, e quando deixa esse envoltório, dele não sofre mais a influência; os sofrimentos físicos que experimenta não lhe deixam nenhuma lembrança penosa; dele não lhe resta nenhuma impressão desagradável, porque não afetaram senão o corpo e não o Espírito; é feliz de estar livre dele, e a calma de sua consciência o livra de todo sofrimento moral. Disso interrogamos milhares, tendo pertencido a todas as classes da sociedade, a todas as posições sociais; estudamo-los em todos os períodos de sua vida espírita, desde o instante em que deixaram seus corpos; nós os seguimos passo a passo, nessa vida de além-túmulo, para observar as mudanças que se operaram neles, em suas idéias, em suas sensações, e sob esse aspecto os homens mais vulgares não foram os que nos forneceram os objetos de estudo menos preciosos. Ora, vimos sempre que os sofrimentos estão em relação com a conduta, da qual sofrem as conseqüências, e que essa nova existência é a fonte de uma felicidade inefável para aqueles que seguiram o bom caminho; donde se segue que aqueles que sofrem, é porque o quiseram, e não devem disso culpar senão a si mesmos, tão bem no outro mundo quanto neste.

Alguns críticos ridicularizaram certas de nossas evocações, a do assassino Lemaire, por exemplo, achando singular que se ocupasse com seres tão ignóbeis, quando existem tantos Espíritos superiores à sua disposição. Esquecem que é por aí que, de algum modo, aprendemos a natureza do fato, ou, para melhor dizer, na sua ignorância da ciência espírita, não vêem, nessas entrevistas, senão uma conversa, mais ou menos divertida, da qual não compreendem a importância. Lemos em alguma parte que um filósofo dizia, depois de conversar com um camponês: Eu mais aprendi com esse rústico que com todos os sábios; é que ele sabia ver outra coisa senão a superfície. Para o observador nada é perdido, encontra úteis ensinamentos até no criptógamo que cresce sobre o estrume. O médico recusa tocar uma chaga horrenda, quando se trata de aprofundar a causa de um mal?

Acrescentamos ainda uma palavra a esse respeito. Os sofrimentos de além-túmulo têm um fim; sabemos que é dado ao Espírito mais inferior elevar-se e purificar-se por novas provas; isso pode ser longo, muito longo, mas depende dele abreviar esse tempo penoso, porque Deus o escuta sempre se ele se submete à sua vontade. Quanto mais o Espírito está desmaterializado, mais suas percepções são vastas e lúcidas; quanto mais está sob o império da matéria, o que depende inteiramente de seu gênero de vida terrestre, mais elas são limitadas e como veladas; tanto a visão moral de um se estende ao infinito, tanto a do outro é restrita. Os Espíritos inferiores não têm, pois, senão uma noção vaga, confusa, incompleta e freqüentemente nula do futuro; não vêem o fim de seus sofrimentos, por isso crêem sofrer sempre, e ainda para eles é um castigo. Se a posição de uns é aflitiva, terrível mesmo, não é desesperadora; a de outros eminentemente consoladora; está pois em nós escolher. Isto é da mais alta moralidade. Os céticos duvidam da sorte que nos espera depois da morte, nós lhes mostramos o que isso é, e com isso cremos prestar-lhes serviço; também vimos mais de um corrigir-se de seu erro, ou pelo menos pôr-se a refletir sobre o que criticavam antes. Não há de tal senão de se aperceber da possibilidade das coisas. Se fora sempre assim, não haveria tantos incrédulos, e a religião e a moral pública ganhariam com isso. A dúvida religiosa não vem entre muitos, senão da dificuldade, para eles, de compreenderem certas coisas; são Espíritos positivos não organizados para a fé cega, que não admitem senão o que, para eles, tem uma razão de ser. Tornai essas coisas acessíveis à sua inteligência, e as aceitam, porque no fundo não pedem melhor do que crerem, sendo a dúvida para eles uma situação mais penosa que se crê ou que querem dizê-lo.

Em tudo o que precede não há nada de sistemas, nada de idéias pessoais; não foram mesmo alguns Espíritos privilegiados que nos ditaram essa teoria, é um resultado de estudos feitos sobre as individualidades, corroborados e confirmados por Espíritos dos quais a linguagem não pode deixar dúvida sobre sua superioridade. Nós o julgamos por suas palavras, e não sobre o nome que trazem ou que podem se dar.

OS ANJOS GUARDIÃES

OS ANJOS GUARDIÃES
Revista Espírita, janeiro de 1859

Comunicação espontânea obtida pelo senhor L.., um dos médiuns da Sociedade.

É uma doutrina que deveria converter os mais incrédulos pelo seu encanto e pela sua doçura: a dos anjos guardiães.
Pensar que se tem, junto de si, seres que vos são superiores, que estão sempre aí para vos aconselhar, vos sustentar, para vos ajudar a escalar a áspera montanha do bem, que são amigos mais seguros e mais devotados que as mais íntimas ligações que se possa contrair nesta Terra, não é uma idéia bem consoladora?
Esses seres estão aí por ordem de Deus; foi ele quem os colocou junto de nós, e estão aí pelo amor dele, e cumprem, junto de nós, uma bela mas penosa missão.
Sim, em qualquer parte que estejais, ele estará convosco: os calabouços, os hospitais, os lugares de deboche, a solidão, nada vos separa desse amigo que não podeis ver, mas do qual vossa alma sente os mais doces impulsos e ouve os sábios conselhos.
Por que não conheceis melhor essa verdade!
Quantas vezes ele vos ajudou nos momentos de crise, quantas vezes vos salvou das mãos de maus Espíritos!
Mas, no grande dia, esse anjo do bem terá, freqüentemente, a vos dizer: "Não te disse isso? E tu não o fizeste. Não te mostrei o abismo, e tu nele te precipitaste; não te fiz ouvir na consciência a voz da verdade, e não seguiste os conselhos da mentira?"
Ah! questionai vossos anjos guardiães; estabelecei, entre ele e vós, essa ternura íntima que reina entre os melhores amigos. Não penseis em não lhes ocultar nada, porque são o olho de Deus, e não podeis enganá-los.
Sonhai com o futuro, procurai avançar nesse caminho, vossas provas nele serão mais curtas, vossas existências mais felizes.
Ide! homens de coragem; lançai longe de vós, uma vez por todas, preconceitos e dissimulações; entrai no novo caminho que se abre diante de vós; caminhai, caminhai, tendes guias, segui-os: o objetivo não pode vos faltar, porque esse objetivo é o próprio Deus.
Àqueles que pensam que é impossível a Espíritos verdadeiramente elevados se sujeitarem a uma tarefa tão laboriosa e de todos os instantes, diremos que influenciamos vossas almas estando a vários milhões de léguas de vós: para nós o espaço não é nada, e mesmo vivendo em um outro mundo, nossos espíritos conservam sua ligação com o vosso. Gozamos de qualidades que não podeis compreender, mas estejais seguros que Deus não nos impôs uma tarefa acima de nossas forças, e que não vos abandonou sozinhos na Terra, sem amigos e sem sustentação.
Cada anjo guardião tem o seu protegido, sobre o qual ele vela, como um pai vela sobre seu filho; ele é feliz quando o vê seguir o bom caminho, e geme quando seus conselhos são desprezados.
Não temais nos cansar com vossas perguntas; ficai, ao contrário, em relação conosco: sereis mais fortes e mais felizes.
São essas comunicações, de cada homem com seu Espírito familiar, que fazem todos os homens médiuns, médiuns ignorados hoje mas que se manifestarão mais tarde, e que se espalharão como um oceano sem limites para refluir a incredulidade e a ignorância. Homens instruídos, instruí; homens de talento, elevai vossos irmãos. Não sabeis que obra cumpris assim, é a do Cristo, aquela que Deus vos impôs.
Por que Deus vos deu a inteligência e a ciência, se não para partilhá-las com vossos irmãos, certamente para avançá-los no caminho da alegria e da felicidade eterna.
São Luís, Santo Agostinho.

Nota. - A doutrina dos anjos guardiães, velando sobre seus protegidos, apesar da distância que separa os mundos, nada tem que deva surpreender; ela é, ao contrário, grande e sublime.
Não vedes sobre a Terra, um pai velar sobre seu filho, embora dele esteja distante, ajudar com seus conselhos por correspondência?
Que haveria, pois, de espantoso que os Espíritos possam guiar aqueles que tomam sobre sua proteção, de um mundo ao outro, uma vez que, para eles, a distância que separa os mundos é menor que aquela que, na Terra, separa os continentes?

A HOMEOPATIA NAS DOENÇAS MORAIS

A HOMEOPATIA NAS DOENÇAS MORAIS
REVISTA ESPÍRITA - MARÇO DE 1867

Pode a homeopatia modificar as disposições morais?
Tal é a pergunta que se fazem alguns médicos homeopatas e à qual não hesitam em responder afirmativamente, apoiando-se em fatos.
Levando-se em conta a sua extrema gravidade, vamos examiná-la com cuidado, de um ponto de vista que nos parece ter sido negligenciado por aqueles senhores, por mais espiritualistas e mesmo espíritas que sem dúvida o sejam, porque há pouquíssimos
médicos homeopatas que não sejam uma ou outra coisa. Mas, para
a compreensão de nossas conclusões, algumas explicações preliminares sobre as modificações dos órgãos cerebrais são necessárias, sobretudo para as pessoas estranhas à fisiologia.
Um princípio que a simples razão faz admitir, que a Ciência constata diariamente, é que nada há de inútil na Natureza, que, até nos mais imperceptíveis detalhes, tudo tem um fim, uma razão de ser, uma destinação. Este princípio é particularmente
evidente no que respeita ao organismo dos seres vivos.
Em todos os tempos o cérebro foi considerado como o órgão da transmissão do pensamento e a sede das faculdades intelectuais e morais.
Hoje é reconhecido que certas partes do cérebro têm funções especiais e são afetadas por uma ordem particular de pensamentos e de sentimentos, pelo menos no que concerne à generalidade; é assim que se colocam, instintivamente, na parte anterior, as faculdades do domínio da inteligência, e que uma fronte fortemente deprimida e estreitada, é, para todo o mundo, um sinal de inferioridade intelectual.
As faculdades afetivas, os sentimentos e as paixões se acham, por isto mesmo, como tendo sua sede em outras partes do cérebro.
Ora, se se considera que os pensamentos e os sentimentos são excessivamente múltiplos, e partindo do princípio de que tudo tem sua destinação e sua utilidade, é permitido concluir
que cada feixe fibroso do cérebro não só corresponde a uma faculdade geral distinta, mas que cada fibra corresponde à manifestação de uma das nuanças desta faculdade, como cada corda de um instrumento corresponde a um som particular.
É uma hipótese, sem dúvida, mas que tem todos os caracteres da probabilidade, e cuja negação não infirmaria as conseqüências que deduziremos do princípio geral; ela nos ajudará em nossa explicação.
O pensamento é independente do organismo. Não há por que discutir aqui esta questão, nem refutar a opinião materialista, segundo a qual o pensamento é secretado pelo
cérebro, como a bile o é pelo fígado, nasce e morre com esse órgão; além de suas funestas conseqüências morais, esta doutrina tem contra si o fato de nada explicar.
Segundo as doutrinas espiritualistas, que são as da imensa maioria dos homens, não podendo a matéria produzir o pensamento, este é um atributo do Espírito, do ser inteligente, que, quando unido ao corpo, serve-se dos órgãos especialmente destinados à sua transmissão, como se serve dos olhos para ver, dos pés para andar. Sobrevivendo o Espírito ao corpo, o pensamento também lhe sobrevive.
Segundo a Doutrina Espírita, não só o Espírito sobrevive, mas preexiste ao corpo; não é um ser novo; traz, ao nascer, as idéias, as qualidades e as imperfeições que possuía; assim
se explicam as idéias, as aptidões e os pendores inatos.
O pensamento é, pois, preexistente e sobrevivente ao organismo. Este ponto é capital e é por não o terem reconhecido que tantas questões ficaram insolúveis.
Estando na Natureza todas as faculdades e aptidões, o cérebro encerra os órgãos, ou, pelo menos, o germe dos órgãos necessários à manifestação de todos os pensamentos.
A atividade do pensamento do Espírito sobre um ponto determinado impele ao desenvolvimento da fibra ou, se se quiser, do órgão correspondente; se uma faculdade não existir no Espírito, ou se, existindo, deve ficar em estado latente, o órgão correspondente,
estando inativo, não se desenvolve ou se atrofia.
Se o órgão for atrofiado congenitamente, não podendo manifestar-se a faculdade,
o Espírito parece dele privado, embora de fato o possua, desde que lhe é inerente. Enfim, se o órgão, primitivamente em seu estado normal, se deteriora no curso da vida, a faculdade, de brilhante que era, vai perdendo a cor, depois se apaga, mas não se destrói; é
apenas um véu que a obscurece.
Conforme os indivíduos, há faculdades, aptidões, tendências que se manifestam desde o começo da vida, enquanto outras se revelam em épocas mais tardias e produzem as mudanças de caráter e de disposições que se notam em certas pessoas.
Neste último caso, geralmente não são disposições novas, mas aptidões preexistentes, que dormitam até que uma circunstância as venha estimular e despertar. Pode-se estar certo de que as disposições viciosas, que por vezes se manifestam subitamente e tardiamente, tinham seu germe preexistente nas imperfeições do Espírito, porque este, marchando sempre para o progresso, se for essencialmente bom não pode tornar-se mau, ao passo que de mau pode tornar-se bom.
O desenvolvimento ou o enfraquecimento dos órgãos cerebrais acompanha o movimento que se opera no Espírito. Essas modificações são favorecidas em todas as idades, mas, sobretudo, na juventude, pelo trabalho íntimo de renovação que se opera incessantemente no organismo, da seguinte maneira:
Como se sabe, os principais elementos do organismo são o oxigênio, o hidrogênio, o azoto e o carbono que, por suas múltiplas combinações, formam o sangue, os nervos, os músculos, os humores e as diferentes variedades de substâncias.
Pela atividade das funções vitais, as moléculas orgânicas são incessantemente expelidas do corpo pela transpiração, pela exalação e por todas as secreções, de sorte que se não fossem substituídas, o corpo se reduziria e acabaria por definhar.
O alimento e a aspiração incessantemente trazem novas moléculas, destinadas a substituir as que se vão, de onde se segue que, num dado tempo, todas as moléculas orgânicas são inteiramente renovadas e, numa certa idade, não existe mais uma só das que formavam o corpo em sua origem.
É o caso de uma habitação, da qual se arrancassem as pedras uma a uma, substituindo-as à medida por uma nova pedra da mesma forma e tamanho, e assim por diante, até a última. Terse-ia sempre a mesma casa, mas formada de pedras diferentes.
Dá-se o mesmo com o corpo, cujos elementos constitutivos são, conforme os fisiologistas, totalmente renovados de sete em sete anos.
As diversas partes do organismo sempre subsistem, mas os materiais são mudados. Dessas mudanças gerais ou parciais nascem as modificações que sobrevêm, com a idade, no estado sanitário de certos órgãos, as variações que sofrem os temperamentos, os gostos, os desejos que influem sobre o caráter.
Nem sempre as aquisições e as perdas estão em perfeito equilíbrio.
Se as aquisições superam as perdas, o corpo cresce, aumenta; se se dá o contrário, o corpo diminui.
Assim se explicam o crescimento, a obesidade, o emagrecimento, a decrepitude.
A mesma causa produz a expansão ou a interrupção do desenvolvimento dos órgãos cerebrais, conforme as modificações que se operam nas preocupações habituais, nas idéias e no caráter.
Se as circunstâncias e as causas que agem diretamente sobre o Espírito, provocando o exercício de uma aptidão ou de uma paixão, forem mantidas em estado de inércia, a atividade que se produz no órgão correspondente aí faz afluir o sangue e, com ele, as moléculas constituintes do órgão, que cresce e toma força em proporção desta
atividade. Pela mesma razão, a inatividade da faculdade produz o enfraquecimento do órgão, do mesmo modo que uma atividade muito intensa e persistente também pode levar à sua desorganização ou enfraquecimento, por uma espécie de gasto, tal como acontece com uma corda muito esticada.
As aptidões do Espírito são, pois, sempre uma causa, e o estado dos órgãos um efeito. Pode suceder, entretanto, que o estado dos órgãos seja modificado por uma causa estranha ao Espírito, tal como doença acidental, influência atmosférica ou
climática; então são os órgãos que reagem sobre o Espírito, não alterando as suas faculdades, mas perturbando a sua manifestação.
Um efeito semelhante pode resultar das substâncias ingeridas no estômago, como alimentos ou medicamentos. Essas substâncias aí se decompõem, e os princípios essenciais que encerram, misturados ao sangue, são levados, pela corrente da
circulação, a todas as partes do corpo. É reconhecido pela experiência que os princípios ativos de certas substâncias são levados mais particularmente a tal ou qual víscera: o coração, o fígado, os pulmões, etc., e aí produzem efeitos reparadores ou deletérios, conforme sua natureza e propriedades especiais.
Algumas, agindo desta maneira sobre o cérebro, podem exercer sobre o conjunto, ou sobre partes determinadas, uma ação estimulante ou estupefaciente, conforme a dose e o temperamento, por exemplo, as bebidas alcoólicas, o ópio e outras.
Nós nos estendemos um pouco sobre os detalhes que precedem, a fim de dar a compreender o princípio sobre o qual pode apoiar-se, com aparência de lógica, a teoria das modificações do estado moral por meios terapêuticos.
Esse princípio é o da ação direta de uma substância sobre uma parte do organismo cerebral, tendo por função especial servir à manifestação de uma faculdade, de um sentimento ou de uma paixão, porque não pode vir ao pensamento de ninguém que tal substância possa agir sobre o Espírito.
Admitido, pois, que o princípio das faculdades esteja no Espírito, e não na matéria, suponhamos que se reconheça numa substância a propriedade de modificar as disposições morais, neutralizar uma inclinação má: isto só poderia ser por sua ação sobre o órgão correspondente a essa inclinação, ação que teria por efeito interromper o desenvolvimento desse órgão, atrofiá-lo ou paralisá-lo, se for desenvolvido.
Torna-se evidente que, neste caso, não se suprime a inclinação, mas a sua manifestação, absolutamente como se ao músico se tirasse o seu instrumento.
Provavelmente são efeitos desta natureza que certos homeopatas observaram, e que os levaram a crer na possibilidade de corrigir, com o auxílio de medicamentos apropriados, vícios tais como o ciúme, o ódio, o orgulho, a cólera, etc.
Uma tal doutrina, se verdadeira, seria a negação de toda responsabilidade moral, a
sanção do materialismo, porque, então, a causa de nossas imperfeições estaria só na matéria; a educação moral se reduziria a um tratamento médico; o pior homem poderia tornar-se bom sem grandes esforços, e a Humanidade poderia ser regenerada com o
auxílio de algumas pílulas.
Se, ao contrário, como não padece dúvida, as imperfeições forem inerentes à própria inferioridade doEspírito, não se o melhorará pela modificação de seu invólucro
carnal, como não se endireitaria um corcunda, dissimulando sua deformidade sob os tecidos de suas roupas.
Contudo, não duvidamos que tais resultados sejam obtidos em alguns casos particulares, porquanto, para afirmar um fato tão grave, é preciso ter observado; mas estamos convictos de que se enganaram com a causa e o efeito.
Por sua natureza etérea os medicamentos homeopáticos têm uma ação de certa forma
molecular; sem dúvida podem agir, mais que outros, sobre certas partes elementares e fluídicas dos órgãos e lhes modificar a constituição íntima. Se, pois, como é racional admitir, todos os sentimentos da alma têm sua fibra cerebral correspondente para a
sua manifestação, um medicamento que agisse sobre essa fibra, quer para a paralisar, quer para exaltar sua sensibilidade, paralisaria ou exaltaria, por isso mesmo, a expressão do sentimento, do qual fosse instrumento, mas o sentimento não deixaria de subsistir.
O indivíduo estaria na posição de um assassino a quem se tirasse a possibilidade de cometer homicídios, cortando-lhe os braços, mas que conservasse o desejo de matar. Seria, pois, um paliativo, mas não um remédio curativo.
Não se pode agir sobre o ser espiritual senão por meios espirituais; a utilidade dos meios materiais, se fosse constatado o efeito acima, talvez fosse de dominar mais facilmente o Espírito, de o tornar mais flexível, mais dócil e mais acessível às influências morais; mas nos embalaríamos em ilusões se esperássemos de uma medicação qualquer um resultado definitivo e duradouro.
Seria completamente diferente se se tratasse de ajudar a manifestação de uma faculdade existente.
Suponhamos um Espírito inteligente encarnado, não tendo ao seu serviço senão um
cérebro atrofiado e não podendo, por conseguinte, manifestar suas idéias: será para nós um idiota. Admitindo, o que julgamos possível à homeopatia, mais do que a qualquer outro gênero de medicação, que se possa dar mais flexibilidade e sensibilidade às fibras
cerebrais, o Espírito manifestaria seu pensamento, como um mudo, ao qual se tivesse desatado a língua. Mas se o Espírito fosse idiota por si mesmo, ainda que tivesse ao seu serviço o cérebro do maior gênio, nem por isso seria menos idiota.
Não podendo um medicamento qualquer agir sobre o Espírito, não lhe poderia dar o
que não tem, nem tirar o que tem; mas agindo sobre o órgão da transmissão do pensamento, pode facilitar essa transmissão sem que, por isto, nada seja mudado no estado do Espírito. O que é difícil, o mais das vezes mesmo impossível no idiota de nascença, porque há interrupção completa e quase sempre geral do desenvolvimento nos órgãos, torna-se possível quando a alteração é acidental e parcial.
Neste caso, não é o Espírito que se aperfeiçoa, são os meios de comunicação.

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