A
controvérsia prosseguia...
Alfredo
e Pirilo, dois amigos dedicados ao estudo da filosofia, permaneciam, horas
inteiras, dialogando sobre a função da alma humana.
Qual
teria sido a primeira força a desdobrar-se na criatura recém-criada pela
Sabedoria Divina? A inteligência ou o instinto?
Alfredo
admitia que a inteligência teria tido a prioridade, enquanto Pirilo acreditava
que o instinto teria sido o começo das tarefas evolutivas da alma humana.
O
primeiro exaltava os méritos da razão, filha da inteligência, e o segundo se
reportava ao instinto como sendo o agente da natureza que operava lentamente,
preparando o caminho para o discernimento e, muitas vezes, Pirilo justificava o
seu ponto de vista, acentuando:
-
Do instinto para a inteligência, a estrada é longa a percorrer.
De
forma em forma ou de experiência em experiência, o instinto vai despindo a
própria inferioridade, ou perdendo os impulsos selvagens, até conquistar a
inteligência que o conduzirá ao discernimento e à razão. Por isso é que devemos
usar de muita tolerância e paciência, de uns para com os outros, porque muitos
irmãos se fazem delinqüentes por excesso de agressividade, pelo estado de
evolução deficitária em que se encontram.
Alfredo
ouvia, esboçando gestos de incredulidade, até que, um dia, propôs ao amigo:
-
Façamos uma experiência em que provarei a você que a educação cultivada pela
inteligência dispensa todas as afirmativas que colocam o instinto na base do
processo evolutivo.
Demonstrarei
que basta educar a inteligência e todo o primitivismo do instinto desaparecerá.
E
continuou:
-
Compraremos junto um gato comum, em cuja impulsividade o instinto esteja
reinando... O gato ficará comigo em minha casa e me disponho a educa-lo
esmeradamente. Daqui a um ano; convidarei você para almoçarmos juntos e o
animal se portará com as características de um menino carinhosamente preparado
para a vida social.
Concordaram
ambos com o empreendimento e Alfredo levou o felino para sua própria
residência.
Decorrido
um ano, Alfredo solicitava a presença de Pirilo para o almoço do dia seguinte e
comunicou:
-
Você verá o prodígio da educação. O gato assimilou todos os meus ensinos. Tem
os hábitos de um rapaz de certo nível intelectual.
Pirilo
aceitou o convite com satisfação e na hora aprazada pela manhã do dia imediato,
ei-lo com Alfredo na sala de estar.
O
dono da casa trouxe o gato ao exame do amigo.
O
visitante ficou encantando.
O
felino obedecia a todas as ordens do dono.
Sentava-se,
erguia-se sobre as patas dianteiras e retornava à posição certa, atendendo ao
pedido do educador.
Ao
almoço alimentava-se em um prato especial, levando a comida à boca com a
patinha direita.
Terminada
a refeição, disse Alfredo, entusiasmado:
-
Você viu, Pirilo, a superioridade da inteligência educada sobre o instinto?
-
Estou vendo - respondeu o amigo.
Foi
o momento em que Pirilo voltou à palavra e pediu ao companheiro que fechasse as
portas do aposento em que se achavam e pediu licença para ver até que ponto
chegaria o experimento do bichano.
Alfredo
apoiou a solicitação, e Pirilo, enfiando a mão direita num dos bolsos do
paletó, dali tirou uma caixinha da qual escapou um rato pequeno que saltou para
a mesa, saltitando e correndo qual se estivesse sedento de liberdade.
Bastou
isso e o gato pulou apressado, perseguindo o rato e quebrando todas as peças em
que o almoço fora servido, até que pegou o animalzinho e pôs-se a devora-lo à
vista dos amigos espantados.
Foi
quando Pirilo dirigiu-se a Alfredo, perguntando:
-
Você vê, Alfredo, o poder do instinto que antecede a inteligência e a educação?
Alfredo
sorriu com desapontamento, mas não disse palavra.
A
Semente De Mostarda – Emmanuel – Francisco Cândido Xavier
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